Nas Raias da Net

I- Do real ao virtual:
Fui para o segundo ano e anunciei:
– Preciso de um micro para os trabalhos. E urgente!
Foi assim que ele entrou na minha vida.
Pagamento em dez vezes, com juros. Mas completo e com impressora.
Eu disse completo? Não. Faltava o modem.
Não tinha importância. Internet era coisa de alienado mesmo. Todo o mundo reclamava que a conexão vivia caindo e que era muito lerda.
E depois tinha a história daquela moça que perdeu um baita dinheiro por causa de um falso namorado que conheceu na internet.
Internet? Eu, hein, longe dela!?!
Foi por esse tempo que fui fazer estágio e o patrão, num dia mais animado que de costume:
– Você não quer comprar um modem? Tenho um USRobot sobrando. Pra você eu faço em três vezes, vou descontando no salário.
Pensei um pouco: oferta assim nunca mais… e até que um modem seria bom… além disso tinha provedor dando um mês grátis para experimentar… e eu ia poder pesquisar de tudo para a faculdade…
Resolvi:
– Pago em três vezes, o senhor disse?
– Isso, paga em três e ainda desconto só no pagamento e não cobro juros.
Fiquei animada:
– Fechado. Compro.
Naquela tarde me despedi com uma plaquinha boba na mão, uma coisinha de nada que ia me fazer “navegar” pelo mundo. Mas o que era “navegar” mesmo?
Chamei o rapaz do provedor, um menino, que quase todos os técnicos são meio meninos ainda. Ele apareceu rindo muito, eu era uma cliente em potencial e, naquela época, poucos eram os ligados à rede.
Nunca vou me esquecer daquele barulho: inhoihhhiiiii-toinwiuiiin-chhhhiiiii. Sentei numa cadeira para observar melhor. O moço encaixava um monte de peças e fios que eu nem sonhava para que serviam.
De repente, ele abriu um programa que chamava, como é mesmo? Netscape. Isso, Netscape! Era o tal que ia me fazer viajar pelo mundo, ele disse.
Aquilo era um absurdo! Mas que coisa fantástica ver o Rio de Janeiro ao vivo!!!! E aquele negócio de só digitar a palavrinha e já aparecer tudo que a gente queria? Não, era demais!!!
Hoje eu acharia um absurdo levar uns poucos minutos para baixar um arquivo. Naquela época nem me importava com o tempo, era simplesmente sensacional aparecer a informação assim do nada!
Fiz um contrato com o provedor para usar 30 horas mensais, que combinei de dividir com meu marido. Então, 15 para mim e 15 para ele. Só isso.
Eu só acessava nos fins de semana para não pagar pulsos de telefone. E contava o tempo com precisão para não pagar triplicado caso ultrapassasse o limite.
Uma vez meu marido esqueceu de desconectar e foram contadas 28 horas seguidas. Ficamos sem poder acessar o mês inteiro.
E-mail? Eu nem sabia como receber e passar. Nem tinha certeza da utilidade dele. Para que servia mesmo?
Nesse descaso passei uns dois anos ou mais: acessando ocasionalmente, mal lembrando que uma tal de “internet” estava ali. Muito lenta, eu dizia para quem perguntava.
Mas um dia… sempre existe o “mas um dia”, né? Um dia entrei numa revista de literatura. Fui lendo os textos, gostando de alguns, achando outros não tão bons assim… clicava aqui, ia acolá, voltava ali… revirei o “site” inteiro. Vi, então, isso: “clique aqui para enviar o seu texto”.
Enviar meu texto? Como assim? Cliquei só para ver o que acontecia. Apareceu uma janelinha parecida com o Word. Copiei um texto que já havia escrito há algum tempo e apertei o tal do “enviar”.
Na semana seguinte a revista tinha sido atualizada. E que surpresa quando abri e dei de cara com meu conto e meu nome lá! Puxa, então eles haviam publicado! Que felicidade!
Foi desse jeito que aprendi a enviar e-mails e a me interessar por eles. Lia o texto e, se gostava, mandava um “parabéns” para o autor.
Isso tudo só nos fins de semana. Eu ainda não sabia que podia escrever as mensagens desconectada e só conectar para enviar. Minhas 15 horas foram passando mais rápido que antes…
Quando recebi o primeiro e-mail em resposta, quase desmaiei de alegria. Ah, meu Deus, aquilo ali era mesmo demais!
Fui conhecendo algumas pessoas, trocando informações e entrei até numa lista de discussão sobre cidadania, que coisa!
Passei a esgotar minhas 15 horas em duas semanas e a boicotar as do meu marido:
– Preciso das suas horas, tenho que pesquisar para o trabalho da faculdade e você só usa a internet pra papo-furado…
Ele ficava enraivecido, mas como contestar diante de um trabalho para a faculdade?
Com o tempo, nem as 30 inteiras bastavam para mim. Um amigo me informou, então, que havia um outro provedor que dava horas infinitas por um pouco mais na mensalidade.
Liguei imediatamente para o meu e pedi o desligamento:
– É isso. Trinta horas não me bastam e o outro provedor me oferece horas infinitas.
Veio então a contra-proposta:
– Dou-lhe 60 horas para você continuar conosco.
Fiz cara de espanto no outro lado da linha, resolvi negociar:
– Dá 70 e eu fecho com vocês.
Ele deu. Preferi as 70 e a facilidade na hora do acesso, que as linhas eram em número consideravelmente maior que o provedor das horas infinitas. Levei em conta também as 24 horas de assistência.
Desta forma, pude acrescer minha estadia na rede. Passava agora o sábado e o domingo e mais alguns dias da semana depois da meia-noite “navegando” pelos mares da internet.
Fui ficando cada vez mais interessada por aquilo tudo, contando os minutos para poder ouvir o modem barulhento entrar em ação. Já me incomodavam as saídas que eu tinha de dar, as visitas que chegavam, o mau tempo que me impedia o acesso, os trabalhos da faculdade e até o estágio.
Eu só queria ficar ali, de frente para a tela, vendo coisas e pessoas.
Tornei-me relapsa nas minhas atividades profissionais, esqueci a família, nem me importava se chovia ou fazia sol, se o Tchan fazia sucesso ou deixava de fazer, se Sadam ameaçava voltar. Nada tinha mais importância, só meu computador.
Emagreci e engordei na frente da tela. Amanheci e anoiteci. Nem vi o tempo passar. Esqueci de viver.
… e a lua lá fora era tão linda, me diziam…
As 70 horas também já não eram bastantes. Eu precisava de mais, muito mais. Foi exatamente nessa época que chegou a cartinha do provedor: “vamos proporcionar aos usuários, a partir do próximo mês, horas infinitas”.
Foi uma dádiva! Que bom não precisar tirar extrato nunca mais! Que bom usar a internet e nem ligar para o limite!
Emagreci e engordei mais uma vez. O prato do lado, um sanduíche devorado com avidez quando a informação não entrava: Cacete ­ uma mordida ­, essa porcaria não quer entrar ­ outra mordida e o sanduíche já não existia.
Tive úlcera e cólica renal. Sem falar na LER que sobrevive até hoje.
Passei a ter compulsão pela internet. Já não suportava passar sequer algumas horas longe dela. Vício.
Chegava da aula ou do estágio e deixava a bolsa em qualquer canto, ia correndo ligar o micro. E como era bom ouvir o inhoihhhiiiii-toinwiuiiin-chhhhiiiii do modem!
Ah, como era bom entrar naquele mundo que era de todo o mundo e só meu! Abria a caixa de correspondências, verificava tudo de novo de cinco em cinco minutos: escrevia e-mails, recebia e-mails, deletava e-mails, enviava e-mails.
Só sabia falar em programas, sites, comandos, HPs… nem conversava mais com quem nem tinha ouvido falar disso tudo. Fui me isolando cada vez mais, eu nem precisava de mais nada, a internet era meu mundo!
Um dia, fui apresentada ao ICQ. Instalei numa tremenda ansiedade, sabia que do outro lado me esperavam milhares de pessoas. Tomei um susto enorme com o “apito do navio” e mandei um e-mail para uma amiga: “como faço agora?”
A amiga foi me ensinando e eu fui me apaixonando por aquilo ali. Nomes foram entrando na minha lista, fui conhecendo melhor o programa e quando dei por mim, já estava falando com várias pessoas… e ao mesmo tempo.
O Netscape, desde então, ficou em segundo plano, dando vez ao ICQ. Aprendi a ficar visível e invisível, a enviar recados, a adicionar nomes e a localizar pessoas. Uma maravilha aquilo!
E conheci muita gente. Esqueci de vez da vida fora da net. Só lembrava que tinha de sair quando o dia começava a surgir e os galos do vizinho cantavam. E eu nem tinha dormido nada!
Ia exausta trabalhar, vinha para o almoço e, mal engolia a comida, ia verificar a caixa de correio. Voltava ao trabalho e ia direto para a faculdade. Chegava e, mais uma vez, saltavam as mensagens do dia.
Meus amigos da internet foram aumentando enquanto os de fora evaporaram todos.
Quando dei por mim, já nem lembrava direito o nome da maior parte deles. Já os da net eu conhecia muito, ou achava que conhecia.
Deixei de visitar parentes, deixei de receber parentes em casa. Meu telefone vivia ocupado e eu não me dava ao trabalho de atender à campainha quando tocada.
Enquanto as mensagens baixavam, eu corria para a cozinha e fazia um sanduíche de pão de forma com presunto e queijo. Aquilo era meu almoço, meu jantar.
Passei invernos envolta em cobertores e verões inteiros com um ventilador em minha mira e não notei. O tempo não importava.

II- Do virtual ao real:
Foi nessa época que conheci o Fábio. Meu marido e eu fomos convidados para um jantar. Era uma sexta-feira de agosto e fazia ainda um pouco de frio. Fábio estava lá com a mulher.
Passei a falar com ele todos os dias até muito tarde pelo ICQ. Era professor na universidade em que eu estudava, mas não dava aula para mim. Uma pessoa dócil, meiga e muito inteligente.
Trocávamos fotografias, e-mails e conversávamos em milhares de chats. Nem percebíamos a hora passando, avançando a madrugada. Era tão bom! Gostávamos das mesmas coisas, líamos os mesmos autores. Com o passar do tempo, fomos deixando os autores de lado e nos centrando em nós mesmos.
Ele não estava feliz, eu também não. Viramos confidentes um do outro. A mulher dele era vazia, meu marido também. E nós estávamos repletos de vida. Queríamos o igual, cansados do oposto.
Um dia levei um grande susto, meu coração parecia querer sair pela boca quando abri o e-mail e lá estava, em letras imensas: AMO VOCÊ. Senti uma sensação de adolescente que descobre a primeira espinha no rosto. Alguém me amava, e isso era a coisa de que eu mais precisava no mundo.
Tomei um banho morno, vesti meu roupão surrado, pus uma música muito suave para tocar e voltei para a frente da tela: AMO VOCÊ. Eu não acreditava no que lia. Aquelas letras vermelhas, bem grandes, entravam em mim como flechadas. Eros. Vivi aquele momento com toda a intensidade, eu estava viva e alguém chamado Fábio me amava.
Respondi depois de algumas horas, para gerar expectativa, que as mulheres são sempre meio cheias de história mesmo: EU TAMBÉM. Usei a mesma cor e a mesma letra. E um sentimento que não dá para descrever me acometia, uma reviravolta dentro de mim, tempestade.
Eu me perguntava: cadê aquela mulher sensata que eu conheci? E eu mesma respondia: deixa ela viver em paz! Fiquei muito confusa, eu nunca sequer havia olhado de transverso para outro homem e agora respondia a um “amo você” com a mesma intensidade recebida.
A meia-noite chegou e com ela o nosso encontro no ICQ. Naquele dia terminou a amizade e apareceu a paixão. Trocamos carícias, falamos de nós, ficamos abraçados virtualmente. Eu podia sentir as mãos de Fábio tocando meus cabelos, meu corpo, minha alma. Ele também sentia as minhas.
Meu marido não passava de um homem que morava na mesma casa que eu. Mal conversávamos e quando fazíamos isso, era para falar das contas e da empregada que havia manchado a camisa de linho. Entre nós não existia mais nada além de uma convivência forçada pelo hábito e selada por um contrato.
Fábio me contava que a mulher pouco se interessava por ele, era vazia e não tinha a menor pretensão de falar de literatura que não fosse Paulo Coelho. Ela lia todos os livros de auto-ajuda e espalhava para todo o mundo. Fábio se entristecia e morria de vergonha: falava tanto de tantos autores e ela havia escolhido justamente os que ele mais condenava! Era rasa, oca e fútil, secretária por falta de opção e conformada.
E assim vieram outros milhares de chats. Depois os telefonemas. Uma vez atendi ao celular e meu marido estava do lado, mas ainda pude ouvir o “amo você, minha querida!” Disfarcei, era engano. Também eu sentia saudades e ligava. Aconteceu de umas duas ou três vezes ele estar em plena sala de aula. Eu percebia e dizia apenas: “oi, meu amor, só liguei pra dizer que estou com saudade! Até à noite.” E desligava. O gancho ficava na minha mão, pendurado, como se destituída de força suficiente para devolvê-lo ao lugar.
Eu amava Fábio. Fábio me amava. E já não podíamos mais conter o ímpeto de um encontro. Foi assim que fui parar em plena avenida movimentada de domingo à tarde. Vi o carro dele também estacionado, eu me sentia tão estranha, uma mistura de traição e vida nova, o coração aos saltos, o desejo. Liguei para o celular dele: “Estou bem atrás de você. Ainda dá tempo de desistir. Você tem certeza?”
Claro que ele tinha. Desceu: calça jeans já desbotada, uma camisa polo. Abri a porta do carro, tirei os óculos escuros. Ele entrou e nos beijamos. Ardentes. Desejosos e desejados. Eu sentia o perfume, o hálito, a pele dele. Ele me apertava contra o peito e me acariciava os seios. Eu era dele, ele era meu.
Passada a explosão do encontro inicial, boca não dizia palavra. Bastava o olhar incandescente que lançávamos um para o outro. Ele acendeu um cigarro. Eu batucava o volante de leve, nervosa. De repente, sem mais nem menos, olhou para mim e ouvi aquela voz vibrante e ao mesmo tempo aveludada: “Você é linda!”
Sorri sem jeito e olhei para fora: meninos jogavam bola, pessoas aproveitavam o fim da tarde para caminhar com os cães na coleira, casais namoravam à sombra das árvores. O dia era azul, lindo, o sol brilhava e Fábio me amava. Ali, sentada no banco daquele carro, ao lado de Fábio, eu era a criatura mais feliz do mundo.
Fomos para o motel. Entramos meio sem jeito, eu disfarçava o nervosismo, ele pegava as chaves. Um corredor comprido nos levou ao quarto 23. Ali consumamos a paixão. Não quero descrever o que fizemos, por demais pessoal. Mas era mesmo a melhor coisa que tinha me acontecido na vida. Eu amava aquele homem, loucamente amava aquele homem.
O quarto 23 se tornou nosso conhecido dali em diante. Toda manhã de terça-feira era o nosso ponto de encontro. Ali nos amávamos com ardor, tomávamos nosso café da manhã e conversávamos. Éramos felizes com tão pouco!
Isso durou um bom tempo, talvez um ano. Mas somente uma manhã por semana foi se tornando extremamente pouco para o calor dos corpos. Precisávamos de mais, queríamos mais.
E tinha a minha consciência que apoquentava. Meu marido depositava em mim confiança e eu a transformava em traição. Era horrível lembrar isso, sentia-me desprezível, malvada. E ele era mesmo muito bom, eu só não o amava mais. Era mais uma amiga que a mulher de meu marido.
Desde então Fábio e eu começamos a enfrentar dificuldades. Eu não suportava mais sair às escondidas, ficar me policiando, com medo de ser flagrada. Pior nem era isso, era o sentimento de culpa e desprezo por mim mesma que eu me atribuía.
Fábio se viu em situação difícil: um casamento de vinte anos, dois filhos e uma casa confortável. Não conseguia se desvencilhar desse estereótipo de homem exemplar. Era uma pessoa conhecida e emprestava uma imagem que, mesmo que não fosse sua, já fazia parte dos seus dias.
Para piorar de vez, a mulher do Fábio começou a desconfiar que ele tivesse uma “amante”. Nós nunca nos sentimos “amantes” assim como costumam empregar. Não eram apenas encontros sexuais, era sentimento, amor, ternura.
Eu cobrava uma decisão, que a minha já estava tomada: deixaria meu marido para ficar com Fábio. Ele adiava dia após dia, inventava desculpas, fingia esquecimento. Às vezes eu também fingia porque, afinal de contas, queria mesmo era aproveitar o tempo que ficávamos juntos.
Mas os chats foram diminuindo gradativamente, a mulher o vigiava. E ele não tinha coragem suficiente para assumir o nosso relacionamento. Era fraco e não abdicava nunca da aparência.
Fábio passou a fazer jogo duplo, escondendo muitas coisas de mim. Não entrava na internet mais à noite, os e-mails eram lacônicos e as ligações telefônicas escassas.
As discussões começaram a surgir. Desabafávamos e depois chorávamos, que não era possível a nossa separação. Muita vez saí pisando duro no quarto, garantindo que nunca mais voltaria.
Chegava a terça-feira e ele me ligava. Eu mal ouvia o que ele tinha a dizer e já respondia: “Estou no meio do caminho”. Reatávamos e nos amávamos ainda mais intensamente.
Toda vez que eu me enervava e falava tudo que se prendia em meu peito, Fábio tinha uma crise de tristeza, sentava na cama e chorava como criança. Eu ficava muito chateada também. Às vezes não suportava e chorava junto.
Eu acreditava no amor que ele tinha por mim como a certeza que eu tinha do meu por ele. Mas fui racionalizando um pouco e achando estranho que ele não tomasse nenhuma atitude para se desvencilhar daquilo que nos detinha. Um casamento de vinte anos era tudo o que nos separava.
Ele sempre prometia que ia dar um jeito naquilo tudo, deixar da mulher, estabelecer novos rumos. Nunca cumpria. Inventava pretextos, dizia que a pobre coitada morreria se ele a deixasse, que os filhos passariam a odiá-lo e coisas do gênero. Faltava coragem, era só isso, e eu sabia.
Nessa situação fomos ficando, eu me sentia só um pedaço de carne com quem ele se deitava às terças-feiras pela manhã. Eu era uma satisfação física que ele não era capaz de ter em casa. Alheada, “amante” naquele significado que eu nunca queria entender.
Fiquei deprimida. Sofri calada. Disfarçava minhas lágrimas com base e pó de arroz. Valorizei meu marido ainda mais, embora isso não tenha feito meu amor por ele voltar. Eu estava só. Eu me sentia só. Completamente abandonada pelo homem que eu mais amava no mundo.
Tentava me afastar da internet, tentava suspender os encontros. Não conseguia, a emoção era mil vezes maior que a razão. Eu já não era dona de mim, não podia me conter e aos meus atos.
Toda semana eu me rendia e voltava. Mas com o tempo, passei a cobrar com mais afinco, tornei-me enérgica. Na vez em que ele contou que ia viajar para a Índia com ela, mandei calar a boca, eu não era nenhuma amiguinha para ouvir tudo aquilo. Levantei e tomei meu banho. Saí e disse apenas: “Adeus!”
Ele se enrolou nos lençóis e me pareceu um velho, ombros arqueados, caídos. Um ser quase morto, destituído de coragem, ancião. Olhei aquilo e tive pena, muita pena, porque ele ainda não tinha aprendido a viver. Não seria eu a ensinar. Não mais.
Saí dali sem olhar para trás, chorei no caminho, chorei por muitos dias. Fábio escrevia e-mails e arriscava algumas ligações. Não cedi. Foi a última vez.
Foi para a Índia, não ia adiantar eu insistir, ele sempre ia voltar para casa. Sempre. Queimei todos os presentes, deletei os e-mails e as fotografias. Deletei ainda a minha memória.
Dele só me restam os ombros arqueados e o choro convulsivo. Envelheceu. Morreu.
E eu estou feliz. Sou eu de novo. Renasci.