Poemas de Bia Zolnier

1. SENDO SENSATA
Está mais que na hora
De ser sensata
Parar de brincar
Com ponta de faca
Que pode ferir
Pode machucar
E o que fere também mata
Mata por dentro
Onde desata
O sentimento
Onde desagua
O pensamento
E antes que vire profunda mágoa
Está mais que na hora
De ser sensata
Parar de imaginar
Querer encontrar afinidades
Em quem ignora
A efetiva afetividade
Está mais que na hora
De ser sensata
E admitir a minha verdade
Da qual
Você nunca quis fazer parte
2. TEUS CAMINHOS

Teus caminhos
São tão estranhos…
Inúmeros em quantidade e tamanhos
Me perco nas alamedas estreitas
Tropeço em troncos caídos
Ainda acabo me ferindo nos espinhos
Tão bem escondidos
Das flores com que me enfeitas
Entre sorrisos e carinhos
Teus caminhos
Se perdem em frases feitas
Quando finalmente encontro
O portão de saída
Mas acabo por me deter
Junto aos escombros
Do que foi tua vida
Sutis assombros…
E começo a refazer
O caminho de volta
Algumas coisas escolhemos
Outras…nos escolhem
Teus caminhos
Agora mapeados
Me acolhem…
Compreendo!

3. O QUE HÁ PARA SABER
Nesta noite
Não me questione
Tenho andado tanto por aí
Tentando me encontrar
Negociando com uma parte de mim
Para que não me abandone
Quando tudo o mais quer se deixar
Levar do tudo ao nada…
O que mais há para saber?
O que mais há para dizer?
Tenho andado a esmo
Passando por tantos lugares
Mas parece sempre o mesmo
O mais inóspito dos lares…
Nesta noite
Não questione para onde fui
Ou para onde vou…
Saí por aí
Mas meu espírito ainda não voltou…

4. DESCIDA AO PORÃO DA MEMÓRIA
E ela desceu ao porão
Degrau por degrau
Da escada
Vencendo o repentino medo
Da curiosidade empoeirada
Poeira do tempo
Em que não importava o segredo
Mas agora precisa saber
O que existe lá embaixo
Tão bem guardado pelo silêncio
Ascendeu a luz
Sentindo um incômodo calor
E olhou vagarosamente ao redor
Como que tentando reter
Cada detalhe num simples olhar
Caixas empilhadas
Algumas espalhadas
Difícil saber
Quantas são
O que tem dentro?
Livros. Muitos livros. Muito lidos
Pega um ao acaso
Capa estranha de entalhe
Dourado…mofado
Só um detalhe…
Abriu curiosa
Aproximando-se mais da luz para ver melhor
A umidade deixa as páginas quase pregadas
E o livro pesa mais
À medida que folheia
Então pára assustada
Deixando o livro cair no chão
Tomada pelo pavor que tanto receia
O grito escapa da razão
Acorda agitada
E não está mais no porão
Senta-se na cama
Agora em completa consciência
Tentando refazer na memória
O caminho de volta
Conhecer sua história
…a porta está fechada!

5. PESSOAS-EMBRULHO
Embrulhados em papel-gente
Pouco
Ou muito presente
As pessoas carregam consigo
(Parece louco??)
Um pacote de qualidades
Defeitos
Desejos
Sentidos

Alguns tão grandes
Mas tão ausentes
Outros tão escondidos
Sempre
Em lugares indevidos

Somos pessoas-embrulho
Empacotadas
Com ou sem barulho
(São as interrogações
Reticências e exclamações
Que se enroscam a todo momento)
Ao menor movimento
Não dá para perceber no mundo real
E no virtual,
Todos os pacotes são pardos!

6. ENCANTADA
Mal se apresentou
Já sabia meu nome
Trouxe uma flor
E um poema
Seu… de amor
Parecia me conhecer
Há muito tempo
Pouco
Ou quase nada perguntou
(Quando já estou ficando habituada
A responder, responder, responder…)
O silêncio constrangido
Precisava ser quebrado
Me olhava encantado
Enquanto eu vasculhava
Na memória um assunto perdido
Para ser comentado
Até finalmente decidir
em não dizer nada
(Nem era preciso
O sorriso falava)
Então começou a contar
Uma antiga história chinesa
Agora eu estava encantada!
Passamos a fazer um dueto
Intercalado de narrativa
(Atuação provisória)
Conhecia e amava aquela história!
Nos olhamos assustados
(Aquele susto que se leva
Quando o coração é tocado
Como coisa viva
Que finalmente se releva!)
Não éramos mais estranhos
Passamos a ser elementares
E todo o resto
…apenas noções elementares
Num todo encantamento
Tecido em olhares!