Quando criança, eu tinha um certo medo de estradas. Não da estrada em si, mas de não saber para onde ela ia. Observava a estrada, o seu paralelismo se espremendo lá longe, sumindo devagar, esvaecendo-se numa quase nuvem; ou então, o seu desaparecimento abrupto, numa súbita curva, como num susto.
Dali, da entrada da fazenda, sob o arco de velhas e retorcidas primaveras, eu olhava para aquilo que eu imaginava ser o infinito. O mistério era enorme, o que haveria lá no fim, ou depois da curva? Os espaços eram demasiado vastos para mim, as distâncias me pareciam extraordinárias.
Hoje, eu olho a mesma estrada sem a menor curiosidade, o então infindável caminho agora não tem mais que quinhentos metros, se tanto. Decerto que cresci, vejo agora mais longe, aprendi algumas coisas, imagino. Mas as mesmas perguntas continuam martelando na minha cabeça. Para onde estamos indo? Essa estrada é muito longa, dela nem vejo o fim. Ou acredito que não tenha fim.
Quando, pela primeira vez, ousei ir além da primeira curva, fiquei decepcionado. A estrada continuava. Não resolvia o antigo mistério, apenas mudava-o para mais longe. Indo mais adiante, eu pensava que acharia o final do caminho. Mas não, a estrada emendava em outra, essa em mais outra, e outra…, continuava interminável, passando da terra para o asfalto, cruzando rios por sobre as pontes, enfiando-se em escuros túneis, bifurcando-se, alargando-se, atravessando cidades, circundando montanhas e estendendo-se sobre planícies…, abrindo inúmeros braços e possibilidades.
No meu ínfimo mundo, nos limites do que minha vista podia alcançar, fosse uma cerca, um barranco, fosse o cinzento da mata baixa, o verde-azul das montanhas mais distantes, eu ficava horas me perguntando, tentando adivinhar o futuro, intuindo como seria o fim da estrada. Por quantos lugares ela passaria, quanta gente transitaria por ela, indo e vindo, com quais destinos, constantemente?
Já satisfiz uma parte da minha curiosidade percorrendo novamente os mesmos caminhos. Contudo, não tive as mesmas sensações de antes, por maior o esforço que fizesse. Pelo contrário, a poeira e os buracos, a estrada estreita e curta demais, quase intransitável, me fizeram pensar como era possível supor um mundo com tantos segredos além daquele caminho rústico e empoeirado. Hoje, sensações antigas e semelhantes me invadem somente quando imagino países longínquos, árticos, antárticos, desérticos…, ou ao me ver distraído observando as estrelas…
O rio, que corre atrás da casa onde eu morava, antes me parecia um mar intransponível, a margem oposta muito distante, uma fronteira, como se outro país. É o mesmo rio, mas agora estreito, raso e sujo, e, do outro lado, a pastaria rala e seca, visível como sempre foi. Só eu não via.
A primavera da entrada, no entanto, continua lá, dilacerando-se em cores indefiníveis. Desesperadamente agarrada aos arcos antigos e enferrujados. A primavera envelhecendo, apesar da sua insuspeitada resistência, me parecendo eterna…, a despeito de tudo ser duvidoso.
Os mistérios, no entanto, permanecem, ainda que alterados o local, o objeto e o tempo.
Até quando?