Fio de Náilon

Outro dia ao passar no balcão da padaria, notei entre paçocas, balas e rapaduras, uma estranha caranguejola. Meio escondida, com vergonha eu acho, estava lá uma caneta destas bem comuns. Destas que se roubam sem que ninguém reclame, destas que não chegam a gastar a tinta e já se vão para outras mãos. Estava lá pendurada por um fio de náilon retrátil, maravilha da tecnologia de segurança. Segurança máxima.
Pois justamente uma destas canetas, feitas para a liberdade estava lá pendurada pelo pescoço, como um Tiradentes. Eu, que aprecio canetas, fiquei desolado quando me dei conta da situação daquela em especial.
Eu sei que estas canetas andam por aí às dúzias, vêm em caixas de cinqüenta unidades já para serem perdidas ou surrupiadas. Devolvidas como dizem alguns. Não aquela, em sua sina de caneta de aluguel pra qualquer um usar, desde que não leve. Ela estava ali, presa, passando de mão em mão, assinando cheques baratos, muitos sem fundo. Estava ali só pra assinar, dar seu testemunho de que a dívida é certa, mas nem preencher ela preenche, dado que há máquina pra isto. Cada um que passa pega um pouquinho, com a mão suada, não raro engraxada, uma porcaria só. Pega, assina o cheque e solta. O maldito fio de náilon a puxa de volta, até que alguém mais chegue pra repetir a triste rotina. Seu esforço pode ser visto pelo consumo de tinta, dia após dia. Só em cativeiro este tipo de caneta tem sua tinta consumida do início ao fim.
Com a correria do dia a dia, a gente vê cada situação na rua e, de tanto ver, acaba nem dando bola. Eu que uso estes cartões magnéticos em lugar de cheque, nem peguei na caneta. Desviei os olhos fingindo não notar sua cara de “me solta e me leva”.
De qualquer forma, ela estava amarrada.