Ambos sentados na rede esperavam o tempo passar. Daí ele ligou a televisão. Foi a gota d’água. Ela estava impaciente, como só as mulheres conseguem ficar, perguntava a toda hora e aí?, e ele distraído, uma grande capacidade doada aos homens para sobreviver aos e então e aos e aí das mulheres, vendo a última versão da guerra espacial na televisão de tela home theater, o modelo mais novo que ainda ninguém tinha naquele condomínio classe A, no maravilhoso bairro do Tremembé, ar puro à vontade. Ela insistindo e então?, mais alto, ajoelhada na rede, quase caindo, o marido agarrado à ponta para não despencar, espera só mais esse avião cair, espera…Ela pensando em como o homem pode ser tão infantil, afinal ela, largara tudo, a apresentação do programa mundo cão de maior audiência na televisão, para morar nesse gueto, isolada da civilização e ele a trocava por qualquer programa de aviãozinho caindo. Insistiu mais uma vez. Dessa vez em pé na rede gritando como os índios a mão em concha na boca UUUUUU, ele tendo que se agarrar mais, dessa vez às franjas da rede, calma, tá no fim, veja que loop, ela tirando o top, pondo à mostra os belos seios que até estavam no seguro, esfregando-se nas costas nuas do marido que dizia, veja menina que avião fantástico! Dessa vez ela foi até a mesinha pegou a garrafa de caipirinha e despejou tudo nas costas do marido e ele, ai, que bom, agora lambe, lambe… Deitando-se novamente rangendo os dentes de ódio, comecou a cantarolar a nona de Beethoven llá-ri-llá-llá, com os éles trinados, os roncos do avião encobrindo o seu canto, então agarrando a bermuda do marido, jogou-se sobre ele, aí a rede virou o fio da televisão esticou, ele abaixando-se para ligar o aparelho viu-a e perguntou, menina, o que você está fazendo aí, pelada? nem percebendo que estava nu também. Foi o caos, num esforço descomunal ela soltou os ganchos da rede, quebrou a garrafa de caipirinha e cortou os pulsos com os cacos enquanto ele dizia, essa porcaria de rede tinha que quebrar justo agora… Nisso a velha vizinha do lado olhando por sobre os arbustos ponderou, esses jovens de hoje mais parecem crianças…