Lembro-me, faz muitos anos, de uma propaganda com esta frase, mas sem a interrogação. Talvez fosse uma propaganda institucional, não me lembro pois seu conteúdo se perdeu no tempo, ficou só a frase, afirmativa, Livro, presente de amigo.
O que me leva a uma indagação: por que o livro, hoje, é tão desprezado por boa parte das pessoas na hora de dar um presente?
Outro dia, um conhecido pediu-me que o acompanhasse a uma loja de brinquedos. Seus sobrinhos faziam aniversário no final de semana e a mulher lhe telefonara para providenciar os presentes. Para o garotinho, 9 anos, um boneco Pockemon (corruptela de pocket monsters ou monstro de bolso, essa praga em desenho animado que veio no rastro do “suspeito” He-Man e dos obsoletos Powers Rangers), enquanto a menininha, 7 anos, ia ganhar a velha e famigerada loira Barbie.
– Por que não dá um livro a cada um? – atrevi-me a sugerir – Brinquedos eles vão ganhar aos montes…
– Livro…?! Você ficou louco?! São crianças, cara! – meu conhecido reagiu como se eu lhe tivesse proposto uma obscenidade.
Uma jornalista que conheci na faculdade, vive enchendo a sobrinha de roupas e brinquedos caros, mas nunca lhe deu um único livro. Diz que é trauma de infância, pois teve uma tia (solteirona como ela) que vivia lhe entupindo de livros, o que resultou numa absoluta ojeriza por estantes e lombadas. Vive pulando de emprego, e sempre bons empregos, talento exclusivo, imagino, de um belíssimo par de pernas, porque seu texto sempre foi de uma mediocridade atroz.
O fato indiscutível é que ler, e gostar de ler, só traz benefícios para os viciados. É verdade que uma criança leitora pode ser mais difícil de ser educada pelos pais, mas não porque o hábito de ler seja nocivo, e sim porque contribui para ampliar o grau de conhecimento e raciocínio desta criança – – que, lendo, vai adquirir discernimento para formar sua própria opinião e, aí eu reconheço, pode haver problemas mesmo.
Porque não é muito fácil admitir que um/a pirralho/a, a quem pai e mãe deram de comer na boca e limparam cocô e cuidaram quando doentes e levaram à escola e ensinaram tudo-tudo-tudo, de repente resolva não obedecer a uma ordem simplesmente porque pensa diferente.
Se bem que, verdade seja dita, criança ou adolescente, mesmo sem praticar o saudável vício da leitura, têm por norma de conduta sempre desobedecer ou questionar o que os pais lhes exigem. Parece que é um chip de rebeldia instalado sabe-se lá por quem no cerebelo do bebê, ainda na barriga da mãe, e que vem de tempos imemoriais, antes mesmo da primeira inscrição ser feita numa pedra lascada.
Brincadeiras à parte, este desprezo ao livro por uma parte da sociedade só pode ser entendido como preconceito de adultos que, quando crianças, não foram estimulados a passeios pela Via Láctea da imaginação, a dar a volta ao mundo em um balão, visitar o fundo do mar ou ir à lua sem tirar os pés do chão.
Não se pode culpá-los ou execrá-los como elementos perniciosos à formação de uma geração melhor, mais competente e mais bem preparada para os enfrentamentos da vida. E sim trazê-los para uma participação que parta do princípio básico de que nenhum cidadão, nenhum mesmo!, com um mínimo de conhecimento e informação, tenha um dia de, obrigado, compor uma manada.
Acredito que nossas crianças mereçam pelo menos isto. A oportunidade de oferecer uma alternativa de leitura para cada um dos muitos amigos que se têm nesta idade.