Acostumada com a presença de insetos tirou o inseticida do armário e aspergiu pelo quarto. Desencostou a cama, deslocou os quadros, fechou a porta e, como sempre, voltou à sala e à leitura. O procedimento prosaico e cotidiano aborrecia sua paciência além de causar um sufoco nada agradável. Morar longe da civilização era o resultado de não querer brigar, mas se ela soubesse…
Se fossem só os pernilongos e borrachudos ainda não era nada mas havia os outros bichos: a cobra encontrada no quarto de despejo; a outra cobra que descansava embaixo do tanque; o lagarto listado que chicoteava com o rabo para se defender; as formigas devoradoras de roseiras; os gatos aparecidos mortos, envenenados por alguém que certamente detestava ficar sem dormir enquanto os felinos resolviam fazer amor; cães sarnentos e cheios de carrapatos invadiam seu terreno deixando uma herança pestilenta para seus animais bem tratados; o bicho de duas pernas a quem ela chamava de “guloso ladrão” pois quando esse aparecia os cachos de banana sumiam das bananeiras e no dia seguinte não alimentavam os passarinhos; os cavalos do vizinho com o costume de dormitar bem em frente ao seu portão impedindo a entrada e saída dos carros; um filhote de lagarto resolveu morar em sua sala ; minúsculas aranhas devoravam suas orquídeas; aranhonas teciam suas casas na porta da cozinha; encontrou um peixinho morto dentro de seu carro depois desse precisar ser empurrado ao passar por um rio que em dias de chuva invadia a estrada; gambás cuidavam de seus filhotes no forro; morcegos com vôos assustadores ao cair da noite; abelhas não deixando os cocos vingarem ; lesmas, etc. etc. além das baratas, dos cupins e outras espécies de mosquitos que as vezes voavam tão denso tirando a claridade da lâmpada! Sem contar, é claro, as moscas verdes que adoravam colocar ovos na pele sofrida de sua velha, querida e pequenina cachorra! Do terror provocado pelo barulho das cobras enroscadas na calha do telhado não era possível esquecer! Morar ali era desesperador!
Naquela noite demorou mais para voltar ao quarto; já era madrugada e só havia o nada. Como de costume despiu-se, vestiu a camisola e quando já ia deitar… o susto! Ao lado de sua cama dois olhinhos ávidos fitavam. Era um sapo, ou coisa que o valha! A indignação deu fim ao sono e descontando com gritos seu furor acumulado só sossegou quando por fim, com vassouradas, tirou o gosmento do quarto; fechou a porta para garantir um sono sem surpresas desagradáveis e, como possuía um senso quase infantil, pensou que em vez do sapo a surpresa poderia ter sido a volta antecipada de seu príncipe.
Na claridade do dia seguinte, com uma gargalhada, recuperou o bom humor ao ver o bichinho morto. Esse ao menos não iria mais importuná-la. Ficou esperando o marido…