Palavra,
por que navegas
em teu barco que não compreendo,
com teus remos de metáfora,
em águas tão transparentes
feitas de outras mil palavras?
Palavra,
teu nome é doce,
é fome de quem não come,
música para quem não ouve
e que ruído algum pressente.
Palavra, surpresa e vício,
em ti o fim e o início
principiam sem cessar.
Assopro a palavra dura,
revisto-a com figuras
e as tento compreender;
mas, enigma, me desvendas
e pões a nu, quando tentas,
de ti me aproximar
Nomeio-te desde a aurora,
uso-te nas coisas simples,
amo-te espada, alfinete,
pirâmide, pedra, ar.
E navegas minhas águas
(Ulisses, Vasco soberbos)
Mata-me a sede (ou a fome?)
no que trago em mim de homem
e eterno recomeçar.