SONHO VIVIDO
Em Porto Alegre há alguém junto à janela
Desfere olhares sobre a imensidão
Tais olhares provém de um coração
que sabe olhar também e alçando a vela
se apressa em por-se ao largo: é embarcação
Quer envolver um outro olhar que anela
ter dentro de seu próprio. Ah! quem desvela
cultiva um sonho. O sonho nunca é vão
pois antecipa o gozo de algum bem
Quem sonha anela um bem por alcançar
e, se o pode atingir só pelo olhar,
olhar um sonho é algo que convém,
olhar um sonho é um sonho bem vivido;
o olhar que sonha nunca é olhar perdido.
PARTIU
Deixou de lado tudo. Sem apreço
deixou em casa os sonhos e os chinelos.
Partiu. Sem ter sequer novo endereço,
partiu. Só riu. Seu riso era amarelo
A mãe pensou: “Meu Deus, eu não mereço
perder um filho assim, jovem e belo”.
O pai guardou na caixa o violoncelo
que dera ao filho, a custo de alto preço
Não leva sonhos; antes, ilusões
Rompeu com o passado e as tradições
Até o chinelo!, de uso após os banhos
deixou em casa: não mais necessita
Ao leo, prende os cabelos numa fita
a tecer com arame os parcos ganhos