Um dia, quando resolveu olhar pela janela de seu quarto, viu passando um ciclista vestido de vermelho. Voltou para dentro e ficou imaginando quem seria aquele homem e o que estava fazendo naquela estrada onde nunca passava ninguém, e que não levava a nenhum lugar, pelo menos era isso que ela achava.
No outro dia, no mesmo horário, ela postou-se à janela do quarto para ver o que acontecia, e o mesmo ciclista, vestido de vermelho, passou pedalando.
Sem nunca ter saído dali, ela nada conhecia dos costumes da cidade, mas tinha uma imaginação que preenchia seus dias sempre iguais.
Começou a pensar uma porção de histórias para aquele ciclista.
Primeiro pensou: deve ser um moço que vem visitar sua namorada. Ela mora no final da estrada, numa casa pintada de amarelo, com as janelas azuis, e fica esperando o namorado no portãozinho de entrada. Ele chega, desce da bicicleta, e os dois entram abraçados na casinha da estrada.
E então, para ver se o que imaginou estava certo, um dia ela foi andando pela estrada, até chegar no final, onde encontrou exatamente a casinha como tinha imaginado. Voltou contente para casa.
Fazendo o almoço começou a pensar no ciclista de novo. De onde será que ele vinha? Achava que não devia ser da cidade, pois as pessoas da cidade nem conheciam aquela estrada. Pode ser que ele more na outra estrada, aquela que sai da bifurcação antes desta. Deve ser logo depois da curva da pedra branca, lá onde dizem que o padre morreu quando caiu do cavalo. E assim pensando, ela no outro dia saiu cedinho a percorrer o outro lado da estrada, entrou na bifurcação e seguiu com o cachorro ao seu lado até a curva da pedra branca. Andou mais um pouco e logo encontrou uma casa pintada de branco, com as janelas vermelhas. E era lá que o ciclista morava, pois ela tinha pensado assim.
Nas noites quentes do verão ela saia no quintal, e enquanto olhava as estrelas, pensava no ciclista vestido de vermelho. E de tanto pensar, começou a contar as histórias dele para o cachorro, e o cachorro escutava, suas orelhas muito atentas.
E na sua lida, sozinha com o cachorro, pensava e contava cada vez mais histórias.
E depois, ia pela estrada para ver se tudo aquilo era verdade; e sempre encontrava as coisas do jeitinho que tinha pensado.
Pensou na mãe do ciclista, uma velhinha gorda, com os cabelos bem brancos, que vestia um vestido xadrezinho azul e usava um lenço na cabeça. Pensou que o ciclista estava se casando, e quando foi olhar, ele estava morando na casinha pintada de amarelo, e a moça estava com uma criança brincando no balanço que eles tinham feito no quintal.
Depois de algum tempo, ela imaginou que o ciclista e sua família eram seus amigos, e amigos ficaram sendo.
O cachorro brincou com a criança, o casal veio visita-la, a velha ficou sua amiga, e ela nunca mais ficou sozinha.