Made in Brazil

Minhas primeiras aulas de inglês foram lastimáveis. Num desses cursinhos enlatados que prometem deixar você tinindo em dois meses. Minha professora sabia única e exclusivamente o básico do básico, coisas assim como: “Yes, I do”, “very well”, “good morning”, “how are you”, “good bye” e “thank you very much”.
Na verdade ela não sabia nem o básico de português quanto mais de inglês. Ela pronunciava certas palavras pela metade, por exemplo: “árvre”, com erre aberto, em vez de “árvore”, com ênfase no primeiro erre, fazendo a língua tremer no céu da boca, como aprendi no primário com a severíssima Dona Henriqueta, que eu tinha certeza que comia giz. O coque perfeito na cabeça, a mão certeira e pesada, houvesse réguas pra quebrar nas nossas cabeças de vento!
Vocabulário paupérrimo da english teacher, umas cento e cinqüenta palavras, entre elas: pen, dog, cat, boss, mother, father, boy, girl, afora world, que jamais consegui pronunciar direito, ou saía “word”, palavra que significa palavra, ou “wold”, que não significa nada. Ambas erradas. Esse encontro de ele com erre não dá pra ser reproduzido por uma garganta latina, é quase um grunhido ou um rosnar desses de cachorro grande e de pêlo curto. O que ela ensinava a mim e a outros seis alunos atentos era inglês de primeiro estágio, de antes do homem se firmar em duas patas.
Vai daí que o meu inglês de Tarzan dos Macacos, cambeta, devo a isso, a um péssimo e tardio início. Mas logo aprendi no cinema o mais necessário, prestando muita atenção aos diálogos. Os palavrões. Shit, son of a bitch, fuck you, asshole, holy shit, sucker, mother fucker and others, que são as palavras das quais tenho me servido quando num diálogo breve com os gringos. Aliás, nos filmes americanos, especialmente nos chamados filmes de ação, o que mais se fala é palavrão. Os demais ruídos são de tiros, de pneus cantando e de vidros quebrados. Raramente se ouve uma frase sem o famoso e sonoro “fuck”, que quer dizer muita coisa além do simples “fuck”. And they fuck a lot nos filmes. Virou e mexeu, fuck!
Aprendi a contar em inglês, até quatro eu já sabia, de tanto ouvir rock ­ one, two, three, four! e entrava a bateria furiosa… Portanto, não me é muito difícil distinguir um mother fucker ou asshole de dois ou dez deles.
Amigos meus, iniciantes na língua de Shakespeare e Bacon (que depois vim a saber que não é o inventor do toucinho defumado), tiveram já muitas dificuldades por falta de traquejo lingüístico. Um deles foi desembarcado numa escala forçada, em Milão, e mandado de ambulância para um hospital. A conta comeu-lhe todo o dinheiro que tinha. Tudo por causa de uma frase mal entendida. Ele havia dito à aeromoça, em inglês made in Brazil, que estava “morrendo de dor de cabeça”, queria uma aspirina. Não deu outra coisa: ganhou três dias de hospital milanês com direito até a exame de próstata, o abominado toque retal. Custou caro o engano, teve de vir embora com dinheiro emprestado de amigos…
A um outro, a cada vez que pedia café caprichando na pronúncia aprendida em duas semanas de intensivo, alguém perguntava se estava passando mal. E ele que pensava que seu inglês era legitimamente britânico…
Me lembrei de uma crônica, acho que do Paulo Mendes Campos, sobre um brasileiro que foi à Inglaterra para ver a Copa do Mundo de 66. O sujeito não falava uma palavra da língua e tinha ido pra lá como vão muitos: sem reserva de hotel, parco dinheiro, sem saber nada de inglês ou de qualquer outra língua, na pura aventura. No restaurante barato onde ele comia, como não sabia pedir, esperava que alguém pedisse um prato, chamava o garçom e dizia apontando para a comida do vizinho: “mitu”, e comia o que vinha… Com o passar dos dias até o garçom já havia se acostumado, mal ele entrava, já ia perguntando: “Mitu, sir?” Yes!, respondia ele firme. Não podia reclamar da variedade do que comeu, mas comeu cada coisa! Havia dias em que o “mitu” estava ótimo, outros nem tanto…
Vivo dizendo aos meus filhos, aprendam inglês enquanto é tempo, que cavalo velho não pega passo, dizia já meu finado avô que era mineiro, e cuja fala somada aos erres do Vale resulta numa grande facilidade pra pronúncia inglesa, uai!