Um Bom Momento para Mudanças

Nos anos 70 havia um senso comum de que os males do Brasil se deviam ao fato de estarmos vivendo dentro de um regime de restrição política bastante violento que foi o governo Militar. Era comum se acusar o governo daquela época, por sua natureza política, por exemplo , as barbaridades ocorridas em instituições como a Febem, que àquela época vivia de freqüentes rebeliões, pois os garotos trancafiados nas dependências daquela instituição eram tratados como prisioneiros de guerra, com tamanha brutalidade e de forma “desumana” , como se costuma erroneamente se classificar certos atos que chocam o bom senso, mas que nunca são erradicados de nossa sociedade : a injustiça, a vileza, a brutalidade e a violência contra a integridade das pessoas, e que em verdade são, e demasiadamente, humanos.
Porém, com a recente revolta deflagrada na Febem em São Paulo, o que vejo é a repetição de um mesmo filme dos anos 70, só que desta vez, pena, o problema quanto a detenção de menores é o mesmo, senão, pior, mais grave, já que podemos acreditar estarmos vivendo dentro de um regime democrático.
A informação sobre a rebelião ocorrida há pouco chegou a nós pelos veículos de comunicação. O que não nos reportam e portanto ficamos sem saber é sobre o que se passa de fato no interior desta instituição, a problemática vida cotidiana dos menores ali detidos, a forma como são tratados, se há programas implantados que se preocupam em recuperar ou ajudar tais pessoas a alcançarem um momento mais positivo em suas vidas, e ainda, quais são os critérios que a rege, que a leva a internar tais crianças em espécies de manicômios, que ainda hoje, olhando de fora a mim me parecem instituições medievais, quando, supõe-se, a ignorância era maior, mas pelo visto a arrogância não, já que o que falta hoje aos nossos governantes é a humildade. Diante das crises diárias que vivemos nunca se vê um deles admitir um erro.
O fato é que já poderíamos ter desenvolvido um sistema mais inteligente e eficiente que garantisse a saúde de nossa sociedade em se tratando não só da questão do menor infrator como de outros aspectos também, mas, essencialmente da falta de perspectiva de trabalho produtivo e de crescimento econômico uniforme, distribuído a todas as classes sociais.
Mas qual, falta-nos um senso ampliado e abrangente do que seja cidadania, do que seja bem comum, e até mesmo do que seja privado. Há décadas a Febem se constitui em uma enorme chaga de nossa sociedade, mas nada, nem a natureza política de governo muda esta condição. Mas também, para que, né? Tudo isto é complicado, melhor é entreter-se com a festa da filha da Xuxa, dá menos dor de cabeça, não aporrinha ninguém, não vai fazer ninguém sair de casa para falar com as pessoas, discutir o mundo. Temos aí os Jogos Olímpicos, o Ronaldinho…..
Mas, por outro lado, se fôssemos todos como algum caminhoneiro que se constitui num tipo socialmente diferenciado dos indivíduos urbanos e rurais; que passa pelo menos dois terços de sua vida em estradas esburacadas num contexto externo às cidades e campos, vivendo isolado de um núcleo familiar, comendo e dormindo mal, preso à cabine de seu caminhão, faz parte de uma classe que possui quase nenhum controle institucional, sem registros empregadisticios, sem fundos de pensão, sem planos de saúde, sem décimo terceiro, sem fundo de garantia.
Pois é, quando um sujeito destes que normalmente vivem por aí atazanando a nossa pressa nas estradas, resolvem se transformar em exemplo para o país, e demonstrar o que muito de nós já devíamos estar fazendo há muito tempo, e que é simplesmente não ficarmos passíveis a tanta subjugação econômica e dizendo isto não a um empregador, que normalmente vive as mesmas subjugações que um empregado, mas ao Governo que de fato rege a vida econômica desta nação e tem notadamente preferência em ajudar corporações financeiras ao invés de corporações sociais.
Porém, dá para perceber que quando as corporações sociais se fazem notar, como agora no caso dos caminhoneiros, há possibilidades de diálogo com o Estado, de interagir-se no processo político. Nós cidadãos comuns, fazemos parte de alguma corporação ou estamos condenamos ao eterno entretenimento televisivo?