ainda sou estranho, louva-a-deus esguio sobre as patas traseiras. outrora, fui formiga… parece inconcebível a compreensão da reencarnação dos insetos, mas acreditem em mim, se estou ainda sobre as patas traseiras, antes diminutas, é que me preparo para a defesa. a sobrevivência exige vida alerta contra o que há de perigoso. o homem, por exemplo. porque o homem decidiu tomar o mundo para si, como um pertence, sem atinar que o mundo não passa de uma grande pedra encharcada. mas como eu disse, outrora fui formiga… representei junto a milhares de outras.
naquele tempo aprendi os sinais do perigo: o gesto das mãos humanas com panos úmidos, um dedo de esmagar, ou a língua pegajosa dos tamanduás. mas agora sei. dos perigos, homens e tamanduás, é mais sublime morrer.
com homem, porém, mediríamos forças se nos deparássemos de igual tamanho? não… o homem é covarde. melhor servir de alimento para a fome da irracionalidade…
é tarde. e ainda sou estranho, louva-a-deus esguio sobre as patas traseiras. no entanto, daqui a pouco serei silêncio, porque o homem vem aí…
das folhas
alguns deles zombam de mim, porque coleciono folhas secas. mal sabem que elas são parte que não sei explicar.
por isso, todos os dias espalho-as pelas casas. muitos, todos se incomodam. não entendem. Essas casas são lugares sagrados entre tantos edifícios…
um dia, se deixarei de conduzir conversas que carrego, desaparecerei.
mas enquanto isso, aqui, tento apenas relatar esta vida de vento.