Era uma vez um muro. Ele não era um muro qualquer, desses comuns. Não era muro de separar vizinho e de espiar por cima. Nem era daqueles que ladrão pula devagar para invadir a casa e pula depressa para fugir dos cachorros de guarda. Muros históricos, como o de Berlim e o da China, também não era. Esse era diferente. Ainda há os muros da mente, os bloqueios, os medos, o tímido que não consegue dizer para a pessoa amada o que realmente sente por ela. O muro de que falo é mais ou menos assim.
Eu já conhecia este muro há algum tempo quando resolvi estudá-lo. Ele era simplesmente fascinante. Altamente complexo, nem mesmo o sábio Isaac Newton conseguiria decifrá-lo por completo. Ou seria melhor convidarmos Sigmund Freud? Nas minhas pesquisas descobri que um tesouro inestimável estava escondido no outro lado. Um tesouro que me fascinou e me cativou de tal louca maneira que me pus a tentar derrubar o muro com todas as minhas forças.
Oras, consciência maldita! Porque não me deixas em paz? Não foi por luxúria, ganância nem por qualquer outra ruindade do homem que tentei derrubá-lo, e tu sabes muito bem disso!
Meus golpes contra o muro foram bem diversificados. Tentei pulá-lo na esperteza, mas não consegui. Ele era alto e imponente. Se eu tivesse sido mais audaz poderia ter conseguido meu intento, mas também poderia ter caído de cabeça no chão. Preferi não arriscar. Tentei ajudá-lo com pinturas e polimentos, pois assim lapidaria aquela beleza que tanto admirava e ao mesmo tempo cultivaria sua confiança, sem a qual seriam fracassadas, de antemão, todas as minhas investidas. Insisto em dizer que não foi por interesse que o pintei e poli. Foi por paixão àquele monumento. Meu trabalho até que ficou bom, mas quando pedi minha recompensa recebi uma frustrante negativa.
Tentei até mesmo ajudar um amigo a saltar sobre ele, mostrando também que não sou egoísta, mas ele desistiu antes mesmo de começar. Talvez não fosse bravo ou louco o suficiente.
Fiquei algum tempo sem atacá-lo, desestimulado pelas derrotas. Só o observava de longe, pensando, pensando. Às vezes sinto que pensei até demais. Resolvi agir. Mandei uma bomba que julgava potente em sua direção. A explosão foi gigantesca! Pedaços do muro vieram até mim algum tempo depois, estilhaços ao vento. Me aproximei, no meio da fumaça, com o peito cheio de esperança e de ansiedade. Como deve ser o outro lado do muro? Que segredos ele esconde? Encontrarei lá o amor?
Tudo durou menos do que dez segundos.
Despedaçado, fragmentado, cansado, desencorajado, vencido, desgastado, arranhado, ferido e com o coração partido. O muro? Não. Ele estava intacto. Eu é que havia caído. E estou no chão até agora…
O que devo fazer? Chorar? Implorar para que ele me deixe entrar, me humilhando e me anulando? Talvez eu não seja digno dos tesouros do muro. Talvez eu seja apenas um plebeu que sonhou com as riquezas do castelo. Talvez eu seja apenas mais um ser humano como todos os outros, com suas conquistas e derrotas, estas sempre prevalecendo em relação àquelas. Talvez eu seja apenas um apaixonado.
Tudo o que quero, pelo menos por enquanto, é ficar de pé novamente.