Miracatês

Economês, advogadês, informatiquês, futebolês… são muitos (e chatos) os linguajares que poluem a comunicação, nos dias de hoje!
Mas na verdade, ninguém é imune à linguagem de seu ambiente profissional, familiar ou regional. Também temos, aqui em casa, um modo próprio de falar, que está incorporado ao cotidiano da família, embora menos hermético que os demais que proliferam por aí.
Aconteceu quando viemos morar em uma pequena chácara, encostada na cidade. Resolvemos chamá-la “Miracatu” (“lugar bom”, em tupi-guarani). Era nossa Pasárgada, o “Reino de Miracatu”, onde seríamos os soberanos.
Ora, todo Reino que se preze necessita de alguma organização. Começamos pelo idioma. Inicialmente, resolvemos adotar o latim (vulgaríssimo) como língua oficial, pra dar status. Não deu certo, evidentemente. Soava algo assim: “Mater Reginas, Guilhermis comedere tuti panis”, “Pater Jocas, desiderare pecunia per spectaculum theatralis et circenses”. Passamos para o tupi-guarani (à moda local), buscando a mais lídima raiz brasileira. Também não deu certo: “Munduçára páia, Liliana uiaxiú”; “Manhã, amuirandê anâma umbuéçáuarúca”. Quem é que entende isso ??? Nossa busca de afirmação pela linguagem fracassou, afinal.
Entrementes, convidamos os amigos a virem plantar árvores na chácara, simbolizando a afeição que nos unia e instalando o verde no território do Reino. Para homenageá-los, batizamos cada árvore com o nome do amigo que a plantara. Temos flamboyant, sibipiruna, castanheira, jacarandá mimoso; as frutíferas: abacateiro, mangueira, laranjeira, jaqueira, etc. Os nomes: Alfredo Costa, Élcio, Berardo, Chico Noronha, Lancha, Pini, Joaquim Ribeiro, Jayr Osório, Fernando Ruas… e um monte de outros amigos.
Aí, deu-se o inevitável. O ambiente moldou, definitivamente, o linguajar local. Passamos a falar em “Miracatês”. É mais ou menos assim:
– “Paiê”, deu mandruvá no Darcy. Precisa pôr veneno nele.
– Luuu, apanha meia dúzia de Facuri.
– O dr. Palermo “tá” amarelinho. (Ipê)
– Esse ano vai dar pouco Noronha.
– Os Mirico “tão” um mel.
– Por que os Finardi “tão” azedos ?
– As pombas fizeram ninho no Miguel Heitor.
– As formigas “tão” atacando o Ary.
– Acabou o Pádua ?
– Dimas e Suavinho “tão” perdendo as folhas.
– O Gaspar “tá” uma flor só.
Facílimo!