Lá fora era noite escura. O lampião iluminava as toalhas de crochê que cresciam sobre o colo da mãe. A filha mais velha havia feito o caçula dormir e se mantinha em silêncio.
– Menina, ocê precisa pensá no enxoval.
Ah, tormenta! Era só levar os olhos para o lado e lá vinha
Lembranças
Gosto de recordar! Lembrar das coisas alegres e , por que não, das coisas tristes também. Lembrar dos acertos da vida e também dos erros, para tirar lições para o presente. A adolescência é um campo fértil de lembranças: a primeira namorada, os encantos do primeiro amor e a primeira desilusão.
Abdicação
Rebelde indomada, mordo a vida aos pedaços
Os dentes rangem sôfregos de carne e sangue
Apertados com ânsia tamanha roendo por dentro
Viro e reviro a cabeça tal qual cadela em coleira de diamantes
Cristalina e pesada
Narinas dilatadas, peito rasgado aberto ao céu
Dias Seguidos de Chuva
Dias seguidos de chuva. À noite, um ventinho mais frio insiste em cutucar meus pés por sob a coberta. Fecho os olhos e fico a imaginar o alvoroço das plantas recebendo cada gotinha em suas folhas, há tempos secas. Fecho os olhos e não consigo deixar, a exemplo do poeta, de ouvir o anjo a sussurrar:
Bobbit
Leio no Terra – lê-se cada coisa no Terra – que o Bobbit, quer reaver a arma (não está claro se faca ou tesoura) que lhe causou tanta notoriedade. Bobbit, todos haverão de lembrar não sem um certo arrepio, é aquele ex-fuzileiro-naval americano que teve o pinto decepado pela própria
Carta
Meu caro João,
Saudades. Tenho vontade de usar aqui os versos de Drummond : “Há quanto tempo já que não te escrevo/ficaram velhas todas as notícias…”, lembra? Com certeza que se lembra daquele nosso velho professor como é que era mesmo o nome dele, hein? que declamava
Diário de Iohanes
Em meados de 1997, o arqueólogo Jorge Prados estava escavando em Roma. Este tinha acabado de se formar em História quando gritou aos seus companheiros para virem ver o que ele tinha acabado de achar. Tratava-se do diário de um homem chamado Iohanes. O diário ainda permanece sem data pois Iohanes
Ninguém vai ler isso…
Ninguém vai ler isso. É apenas um diário, escrevo para me aliviar. Ainda dói, e mal consigo escrever. Não estou conseguindo contar nem para mim mesma! Segredo. Eu sei que ninguém vai ler. E ainda assim, não estou conseguindo colocar para fora. Não quero testemunhas, mas já existe uma. Confissão.
Porto Seguro
A primeira vez que senti medo de verdade foi há muito tempo. Acho que eu tinha pouco mais de quatro anos. Eu estava acostumado a sair com meu pai. Andava com ele aos domingos à tarde, chupávamos sorvete de limão no palito e
Abandono – foto W. Morais
caminhávamos naquele solão. Não
Eternidade e Erro – dois poemas
Nossa história será para sempre
a daqueles livros
com o último capitulo
em aberto
Erro
Construíste minha vida
em alicerces de vento
presos ao solo infértil do teu amor
À minha volta
o abraço transborda vazio
e há mãos que seguram o nada
numa dança desesperada
por te re-encontrar