Urbano

O menino de cara suja
ali sentado
mudo.
-!?
Sua boca não diz, mas seus olhos pedem.
Ele olha e apalpa os que passam.
Sua boca, renitente, dentes podres,
rosto pálido mas bonito e os olhos
denunciam que os anjos não morrem.
O menino de cara suja
ali sentado. Mudo.
E os olhos que pedem.
Ele olha e apalpa os que passam…
-!?
O homem de terno apressado cofia a gravata
preocupado coma queda da bolsa:
“Menos oito, meus Deus!”
O homem de terno apressado é poliglota
e conhece economia internacional.
O homem de terno apressado limpa a fuligem do trânsito
que está sujando sua pele hidratada com cremes
importados.
O homem de terno apressado olha o lenço de linho
cheio de marcas de dedos impressas com a sujeira
urbana de seu rosto suado.
O homem de terno apressado, passos marchados, caminha
determinado e olha o menino de cara suja. Mudo.
O homem de terno apressado movimenta-se aflito.
O homem de terno apressado é poliglota e mudo.
O homem de terno apressado usa óculos mas é míope.
E surdo.
– O homem de terno apressado é muito importante,
dizem.
E o menino de cara suja continua
ali sentado
mudo.
E pedindo
(Os seus olhos continuam apalpando os que passam
Só não dá tempo de apalpar o homem de terno apressado)
-!?
Sobre o asfalto, o calor reverbera e um vento pálido
empurra
p r e g u i ç o s a m e n t e
as folhas secas para a boca de lobo.