Formigas atarantadas
batem cabeça nas esquinas da minha cidade.
Correm para o trabalho
enquanto o sol ensaia um amanhecer tardio.
Carregam pesos imensos,
responsabilidades imensas
com o vento gelado de uma manhã de julho.
Formigas sérias,
grávidas de afazeres,
de urgências urgentíssimas.
Formigas engravatadas
em uniformes cinza e cenhos carregados,
como é de bom tom
a todos os que carregam o mundo nas costas.
Não se olham nos olhos, não se tocam jamais.
Esbarram-se eventualmente
e sua atenção só é despertada
pelo gongo do relógio da torre,
que faz com que olhem simultaneamente
para seus relógios de pulso.
É importante o sincronismo com o tempo da cidade.
O tempo é Deus.
Um Deus de barbas longas
a arratar pelo chão,
como as horas arrastam
todas as formigas de minha cidade
para o matadouro das repartições.
Todos os relógios
em uníssono
badalam seu status
de semi-deuses.
Eles comandam o mundo,
regulam os batimentos cardíacos
a um ritmo controlado
conforme a demanda de emoções permitidas.
Formigas atarantadas
são abalroadas nas esquinas de minha cidade
pelos ventos matinais de julho,
e é possível vê-las do alto de minha janela,
sentindo uma dormência inocente
em minha língua de tamanduá.
SEXO
uma flor se fecha
engolindo minha carne
meu néctar navega seus afluentes