Fausto, definitivamente, não

Se para amar
tenho de arrancar de vez de mim todas
as estranhas sensações
que se transformam em incríveis
dores
se tenho de vagar pelos portões
do Inferno
a implorar que alguém me diga o que fazer
a quanto posso revender ou entregar
a minha alma
num derradeiro e tímido
pregão
se para amar
tenho de cumprir uma promessa paga
a debater-me em dores
que bem melhor ficariam num cavalo
ou num cabrito
berrador
eu passo
ainda que possua a consciência
de que nenhuma história fique
sem um dia ao menos
de cetim
e inesperada glória
porém
por vezes
devo confessar que temo
que este mundo a dormitar dentro de mim
venha a roubar de vez
os muitos dons que aqui carrego
e possa eu estar a perpetrar os dias
em que repor minha caneta interna
com alguma derradeira
tinta
não seja mais aquela garantia
de poemas
escrever
se para amar
tenha de galgar imensas e cruéis estradas
tenha ainda
que gritar ou sussurar
para esconder de fato esse tormento que se dá
ou que – melhor –
despenca
e traz
na avalanche dos meus traumas
a dúvida se sobra ainda
tempo de lutar
se tenho de doar ainda mais o Tempo
se tenho que guardar
dentro de mim algum relógio doido
que poupe a vã tristeza
de ver o lume em certas noites
rarear
então que me perdoem
faunos delicados
amigos
que costumam me abraçar
porém irei contar
com certos deuses quase etéreos
que porventura
venham cá
a me tomar